domingo, 5 de janeiro de 2014

Vão do Masp - Uma viagem no tempo e a dura realidade atual - Antonio Fabiano Jr

Deixo claro no começo: é um texto desabafo. Meu desabafo e de mais ninguém. Assino cada palavra dele, cada vírgula que coloco no lugar errado e cada posição que vai sendo construída por essas mesmas palavras e vírgulas minhas.
Eu sou grato à Lina (1). Às vezes as pessoas me perguntam porque eu escolhi ser arquiteto e nunca respondo a mesma resposta porque, na verdade, ela vai sendo construída todo dia, de um jeito estranho, meio caótico, meio sem certezas mesmo. Mas sei que ela, se não foi a responsável, é um alento para eu ver que tenho que continuar.
Quando pequeno fui ao Masp (2) e lembro-me de tê-lo visto como se estivesse vendo o mar pela primeira vez. Era o mesmo impacto, a mesma vontade de chorar e de rir, o mesmo deslumbramento, encanto, surpresa. Não tinha cheiro de sal, não tinha o ar molhado que cola na nossa pele, nem a areia fina que vai massageando a sola do nosso pé. Mas tinha um piso inteiro com quadros voando colados em vidros e tinha aquele vazio gigante embaixo do prédio, imenso, sem fim como o mar em cima da minha cabeça. Era um outro horizonte, o horizonte que vinha do céu, o horizonte cinza do concreto de uma cidade também cinza que se abria para mim.
Acho que nunca mais vou esquecer aquele piso emborrachado, aquele salão sem fim e aquelas obras que dançavam a dança mais legal que já vi. Porque para mim o Masp é mais do que um bom acervo. É um espaço experimental, onde eu encontro gente de todo tipo. Embaixo do mesmo teto. É onde vejo (via, infelizmente) Van Gogh (obrigado Marjolijn por me ensinar a falar certo o nome dele) do lado de Monet, do lado de Anita Malfatti, do lado de Modigliani, do lado de Degas, do lado de Portinari, do lado de Di Cavalcanti. Todos do mesmo lado, todos vistos hoje porque é assim que é.
o Masp a gente vê (via) a arte feita ontem (e tudo que não é hoje é ontem sendo ela de dez, 50, 1.000 anos atrás) toda junta. E toda misturada porque nossa cabeça é assim. A história é assim, a criação é assim. Sempre fico assustado e simplesmente não compreendo quem fala que para apreciar uma obra de arte é preciso uma certa neutralidade em volta para compreendê-la de fato. Assustado porque, louco que sou, fico pesquisando fotos de ateliês de artistas e vejo que todos eles, absolutamente todos, pintavam em ambientes carregados e lotados de interferências. Tinha cachorro do lado, garrafa de café, música tocando, carteiro chegando. A criação não é asséptica e acho que Lina tinha total razão de nos mostrar que a visualização dela também não deveria ser...
















Museu de Arte de São Paulo – Masp. Arquiteta Lina Bo Bardi - Desenho de Antonio Fabiano, junho 2010

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